Page 27 - IPSO FACTO #12 - Novembro 2022
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ou no exterior, quando praticadas contra a admi- nistração pública nacional, caso que até então não estavam cobertos.
Outro ponto de destaque é que a relação de atos considerados ilícitos é mais ampla do que aqueles que, no senso comum, configurariam delito de corrupção. E a relação está prevista no artigo 5o da Lei 12.846/2013, em que são previstos os casos “comuns” de corrupção, como “prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacio- nada” (artigo 5o, I), em redação que se assemelha muito ao previsto para pessoas físicas no Código Penal de 1940.
Porém, há outras situações em que o particular pode ser responsabilizado independentemente do envolvimento de um agente público (embora par- te da doutrina questione esse entendimento). Por exemplo, a lei tipificou a conduta de “comprovada- mente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídi- ca para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados” (artigo 5o, III). Nesse caso, não há a necessidade da existência de um agente público minimamente coni- vente com o ato, embora possa se pressupor que o agente responsável por um determinado processo administrativo possa ou deva, por exemplo, inves- tigar as empresas participantes ou desconfiar da ir- realidade dos preços combinados que venham a ser apresentados, por exemplo. Embora seja um senso comum de irregularidade nessas situações, a gran- de maioria dos clientes nos quais o nosso Escritório atuou demonstrou surpresa ao descobrir que esses casos também são considerados como corrupção.
O conhecimento da lei, portanto, deve ser o ponto de partida para um programa de integri- dade eficiente. Destaca-se que o recente Decreto 11.129/2022 reforçou a relevância do programa de integridade nas empresas, que deve ser capaz de prevenir, identificar e solucionar problemas relacio- nados à corrupção. Reconhecendo a centralidade do programa na prevenção da corrupção nas empresas, o novo decreto amplia a redução do percentual da multa de 4% para 5% caso a empresa possua progra- ma de integridade considerado eficiente.
Em todos os clientes que já se adaptaram, houve um consenso em estender o programa de integrida- de além do simples cumprimento da lei anticorrup- ção. Temas como transação com partes relacionadas, brindes a parceiros comerciais, tratamento igualitá- rio a fornecedores, contratação de parentes de fun- cionários são sempre tratados em códigos de condu- ta como boas práticas de gestão, preparados com o auxílio do Escritório.
Importante destacar que dado o objetivo princi- pal da Lei Anticorrupção ser a promoção de um am- biente em que práticas comerciais se desenvolvam de forma lícita, como forma de incentivo à adoção de programas de integridade efetivos, a Lei estabelece a
possibilidade de redução da penalidade em caso de malfeito. Há, dessa forma, o compartilhamento de responsabilidade de fiscalização com as empresas, por meio do compliance.
Em todos os trabalhos com nossos clientes buscamos identificar as atividades mais sensíveis a possíveis irregularidades para atacá-las de maneira orientada, e isso é essencial na estruturação de um programa de compliance: o conhecimento da própria empresa, pois não há uma receita padrão. Fragilida- des de uma atividade não são necessariamente as mesmas de outra, por isso todo programa é único.
Esse, aliás, é um benefício paralelo destacado por nossos clientes no trabalho que fazemos: co- nhecer melhor a empresa e as vulnerabilidades. Há, em muitos casos, uma maximização da eficiência administrativa como resultado da eliminação de fo- cos de risco. Outro benefício de haver um programa de compliance efetivo é que esse fato será consi- derado como atenuante a possíveis punições que podem chegar a 20% do faturamento bruto do ano anterior ou R$ 60 milhões.
Embora a lei esteja em vigor há quase 10 anos, há ainda muito a ser feito. No ranking da Transpa- rência Internacional Brasil, com índice de percepção da Corrupção Global por países, o Brasil ficou em 96o lugar, abaixo da média Global e sem avanços em comparação com 2020.
Embora tanto na frente relacionada à LGPD como à Lei Anticorrupção o Brasil e o mercado tenham muito o que caminhar, a tarefa mais árdua, que é a formatação de base legislativa válida, já foi concluída. Resta agora implementar e operacionalizar o que a legislação estabelece de modo a permitir que o am- biente de negócios no Brasil passe a contar com cada vez mais transparência e higidez no tocante às práti- cas de negócio e ao tratamento dos dados pessoais e esteja alinhado com as boas práticas internacionais relacionadas a esses temas.
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Há outras situações em que o
particular pode ser responsabilizado independentemente do envolvimento de um agente público
VANESSA SANTIAGO GIUGLIANO: sócia da área Corporativa do Es- critório de São Paulo.
IVAN HASSE: sócio da área Societária no Escritório de Curitiba. GUILHERME ROXO: sócio da área de Fusões e Aquisições/M&A no Escritório do Rio de Janeiro.
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