Page 15 - Revista IpsoFacto 11
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problemas na abertura dos links e softwares ne- cessários que não foram previamente instalados e impediram a participação das partes ou testemu- nhas, sem que o juiz ou serventuários da justiça, por exemplo, tivessem (porque também surpresos com tal intercorrência e despreparados para solu- cionar a questão) imediatamente intercedido para garantir a eficácia do ato.
Outro exemplo foi de se iniciar audiências vir- tuais agendadas entre procuradores das partes com magistrados para despacho de processos e ainda dentro do horário hipoteticamente reservado para audiência (até o seu encerramento), aparecerem na sala virtual outros advogados, de outros processos, imaginando que, dado o horário de início agendado eletronicamente para esta outra pauta pelo magis- trado, já se poderia entrar na sala virtual sem ne- cessidade de prévio anúncio ou liberação (e não utilizada adequadamente a ferramenta tecnológica existente que impede o ingresso sem prévia autori- zação do chamado host).
Imagine-se o embaraço de todos, do juiz, dos advogados do caso anterior, dos advogados do outro caso; isso sem perder de vista a completa interrup- ção do raciocínio jurídico quanto ao caso que estava se discutindo naquele exato momento da interrup- ção. Mal comparando, é como se, fisicamente, a por- ta da sala de audiências do fórum estivesse fechada com audiência em andamento e, sem que fossem as partes do novo processo da pauta anunciadas for- malmente para adentrarem ao recinto (mecanismo de controle de acesso eficaz nas audiências presen- ciais), estas simplesmente entrassem.
Por outro lado, nota-se que não há uniformida- de quanto aos procedimentos entre os tribunais, o que também causa insegurança às partes e seus procuradores. Qual sistema para salas virtuais usar (Teams, Zoom, Google Meet, Skype etc.)? Qual o melhor navegador de internet para aquele deter- minado ato? Mudou o dress code para audiências virtuais? Adentrar à sala virtual de forma antecipada é sinônimo de pontualidade e cautela ou de impon- tualidade e desrespeito?
E em relação à coleta de depoimento pessoal de testemunha virtualmente? Como garantir que a testemunha, no local em que está, esteja sozinha, garantindo o sigilo daquele ato, inclusive para os fins do art. 385, § 2o do CPC, por exemplo? Como ter a certeza de que não está acompanhada de alguém que a esteja pressionando psicologicamente em de- trimento da lisura e imparcialidade do testemunho?
O que dizer, então, da possibilidade prevista pelo Juízo 100% Digital (e que não é exclusividade desta modalidade de tramitação eletrônica) quanto à comunicação de atos às partes e seus advogados por meio do telefone celular ou e-mail? Já se tem notícia de comunicação de atos processuais por meio do WhatsApp.
Como garantir o cumprimento efetivo deste ato? E a prova de sua realização, como se dará? Será ne- cessário o registro do ato via ata notarial em cartório para dar maior credibilidade à sua realização (ou se terá aqui a aplicação da teoria da aparência)? Como garantir que o aplicativo eleito para o envio da comu- nicação judicial às partes e seus advogados estará ha- bilitado e ativo naquele aparelho de telefonia móvel indicado durante todo o trâmite do processo?
Há, evidentemente, mais perguntas do que res- postas.
Enfim, crê-se que, muito por conta dessas in- tercorrências e incertezas (que se pode dizer es- peradas na etapa de transição) é que o Juízo 100% Digital, uma vez implementado pelo juízo, será, por força de ato normativo (§ 7o do art. 8o da Resolução no 345/20, com redação inserida pela Resolução no 378/21) reavaliado após um ano de sua implemen- tação, podendo o Tribunal optar por sua manuten- ção, descontinuidade ou ampliação, o que deverá ser comunicado ao CNJ. Deverão os tribunais, ainda, acompanhar os resultados do Juízo 100% Digital por meio de indicadores de produtividade e celeridade divulgados pelo CNJ.
Da mesma forma, a já comentada necessidade de consenso entre as partes para utilização, a facul- tatividade e a possibilidade de retratação (em tem- po e modo próprios) da opção pelas partes, repre- sentam, adicionalmente, importantes indicativos de que a implantação do Juízo 100% Digital será reali- zada em doses homeopáticas.
Serventuários da Justiça, aplicadores do direito e partes envolvidas no processo precisarão refletir sobre pertinência e viabilidade da utilização do Juízo 100% Digital caso a caso, de forma que se garanta o devido processo legal com todos os direitos e garantias daí inerentes preservados. Estejamos todos atentos a isso.
“
Sua implantação perante os tribunais e
secretarias das varas não está ocorrendo de forma simultânea e nem mesmo uniformizada. Isso já vem causando muitas dúvidas e insegurança aos advogados
LUDMILA A. KNOP HAUER: advogada senior manager da área de Cível Empresarial no Escritório em Curitiba.
VITOR DANTAS DIAS : sócio da área de Contencioso Tributário no Escritório de Belo Horizonte.
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