Page 6 - IPSO FACTO #12 - Novembro 2022
P. 6

6
IPSOFACTO
CAPA “
A decisão considerou que a energia elétrica é um serviço essencial e que a Constituição admite a fixação de alíquotas diferenciadas levando em conta o critério da essencialidade, de quanto mais importante, mais essencial e menos economicamente esse tributo deve impactar
 consumo e não se pode permitir que em uma tri- butação seletiva haja uma excessiva carga fiscal que impeça que determinados bens e serviços essen- ciais sejam utilizados/consumidos pela população. A sua não observância, ao final, acaba por afrontar o princípio da isonomia tributária, porque faz incidir a mesma tributação gravosa sobre pessoas com di- ferentes capacidades econômicas, sobretudo quan- do se trata de bens/serviços que não podem deixar de serem consumidos, sob pena de afronta à pró- pria dignidade da pessoa”, avalia Leandro Daumas, usando exemplos para esclarecer o que acontece na vida prática: “Uma determinada pessoa, em razão da sua capacidade econômica, pode deixar de con- sumir balas, cigarros e bebidas alcoólicas, já que seu preço é impactado pela alta carga fiscal de ICMS. Mas não pode deixar de consumir energia elétrica, telecomunicações e gás natural, por exemplo, sem que isso tenha impacto negativo na sua qualidade de vida. O princípio da seletividade veio, justamen- te, impedir esta disparidade”.
EFEITO SÓ EM 2024
“A decisão considerou que a energia elétrica é um serviço essencial e que a Constituição admite a fixação de alíquotas diferenciadas levando em con- ta o critério da essencialidade, de quanto mais im- portante, mais essencial e menos economicamente esse tributo deve impactar, mas aplicou a modula- ção para que só passe a produzir efeitos a partir do exercício financeiro de 2024, com exceção daqueles contribuintes que já tinham ações ajuizadas até 5 de fevereiro de 2021”, lamenta Anete Mair Maciel Medeiros, sócia do GSGA. “Quando você declara a inconstitucionalidade de uma tributação, via de regra a decisão produz efeitos para o passado, pre- sente e futuro. A norma nasceu inconstitucional, por isso os efeitos da declaração atingem a norma desde o nascimento. O pior defeito que pode haver em uma norma é a inconstitucionalidade, porque ela viola a Constituição. Entretanto, ao longo dos anos a legislação previu que em algumas hipóteses o STF poderia modular os efeitos de uma decisão, ou seja, definir quando a decisão passa a produzir efeito. Com essa decisão em nossa ação, uma nor- ma declarada inconstitucional continua produzindo
Anete Mair Maciel Medeiros
efeitos este ano”.
Anete Medeiros ressalta que a modulação co-
meçou nas ações diretas de controle de inconstitu- cionalidade e nas ações de controle concentrado. “Depois passou-se a modular até mesmo os proces- sos subjetivos entre as partes no recurso extraordi- nário, que foi o nosso caso. Essa data que eles fixa- ram a partir do ano que vem não é marco de nada. Não é data de marco de início de efeitos da deci- são, de existência do acórdão, não está no Código de Processo Civil, não está na Constituição. Foi uma data que os ministros escolheram aleatoriamente e isso por si só gera insegurança jurídica”.
Geralmente a modulação preserva o passado, para dar segurança jurídica, e os efeitos passam a valer a partir da decisão, via de regra na data da publicação da ata do julgamento, que é quando a decisão se torna pública e passa a existir no mundo jurídico. “Chamou atenção o fato de ter sido uma modulação totalmente atípica, com a decisão de só produzir efeitos a partir do ano de 2024. O contri- buinte ganhou, o Supremo decidiu que deve ser res- peitada a seletividade na tributação do ICMS sobre energia elétrica e telecomunicações porque é subs- tancial para a atividade humana, produtiva e econô- mica dos indivíduos, mas a norma inconstitucional continua valendo, sobre serviços que são essenciais em sua origem, independente da capacidade contri- butiva do contribuinte”.
Outro ponto de destaque é a criação de situa- ções díspares entre contribuintes, já que empresas que ingressaram com ação até fevereiro de 2021 já podem se beneficiar da decisão, enquanto as demais deverão esperar até 2024. “Temos contri- buintes que deveriam estar em igualdade, porque na prática vivenciam a mesma situação, mas serão tratados de forma desigual; alguns estão protegi- dos, outros desprotegidos, e isso prejudica a livre concorrência, com vantagens para alguns, gerando problemas de competitividade no mercado”.
Anete Medeiros aborda outro tópico que pode gerar discussão: a dúvida se os consumidores dos serviços de energia e telecomunicações poderiam ou não pedir restituição desse tributo. “Entende- mos que eles podem solicitar a restituição, porque o tributo foi recolhido indevidamente. Mas, nova-





















































































   4   5   6   7   8